Os dois principais produtores de vacinas do Brasil, o Bio-Manguinhos, unidade produtora de imunobiológicos da Fiocruz, no Rio, e o Instituto Butantan, de São Paulo, entraram de vez na corrida pela produção da imunização contra o novo coronavírus com o avanço de acordos com empresas.
As instituições também iniciaram o planejamento de adequação das fábricas para a manufatura do novo produto.
De acordo com Maurício Zuma, diretor do Bio-Manguinhos, a instituição busca um acordo para a produção de uma vacina no país em negociações com pelo menos quatro empresas.
– Poderíamos começar a produção dessa vacina rapidamente, com capacidade para 40 milhões de doses por mês – diz.
Esse número está dentro da capacidade instalada do instituto, uma vez que será possível adaptar linhas de produção atualmente usadas para outras vacinas.
– Planejamos a implementação de novos turnos de trabalho, juntamente com um rearranjo das atividades produtivas, de modo a garantir o aumento necessário da produtividade para atender a essa nova demanda – afirma o diretor.
Vacinas prioritárias, como as de febre amarela e tríplice viral, que imuniza contra o sarampo, não terão a fabricação afetada, segundo Zuma.
No momento, a função do instituto, delegada pelo Ministério da Saúde, é fazer uma avaliação técnica das vacinas em desenvolvimento que estão em estágio mais avançado e também planejar como adequar a produção.
Atualmente, vacinas contra a Covid-19 em desenvolvimento no mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde. Pelo menos 10 estão na fase de estudo clínico, quando o teste é feito em humanos.
As vacinas em estudo usam diferentes técnicas – algumas usam o vírus inativado e outras apenas o material genético do invasor para estimular resposta imunológica nas pessoas, por exemplo. Zuma diz que o instituto busca empresas que estão na frente nessa corrida e que a plataforma da vacina não vai ser um critério de exclusão na escolha.
– É importante não se precipitar no momento de escolher. Muitas dessas vacinas ainda precisam mostrar resultados e não podemos fazer uma escolha errada – afirma.
O governo de São Paulo anunciou na quinta-feira (11) uma parceria do Instituto Butantan com o laboratório chinês Sinovac Biotech para testar e produzir uma vacina contra o coronavírus . A estimativa é que ela esteja disponível até junho de 2021, se for aprovada nos testes.
– Essa é uma das vacinas com desenvolvimento mais avançado, e o Butantan já trabalha com vacinas do mesmo tipo contra raiva e dengue. Temos a fábrica, e a estrutura física pode ser rapidamente adaptada para sua produção – diz Dimas Covas, diretor-geral do Instituto Butantan.
A vacina da Sinovac usa pedaços inativados do novo coronavírus (que não podem causar a doença) para estimular a resposta imunológica e defender contra a Covid-19.
Segundo Covas, há negociações em andamento com outras empresas, entre elas a britânica AstraZeneca.
– Embora a vacina da Sinovac seja muito promissora, não dá para apostar 100% em uma só. O estudo clínico é decisivo. Muitas podem chegar a essa fase e apresentar problema – afirma.
A capacidade para a produção da vacina da Sinovac, caso ela seja aprovada, está perto de 30 milhões de doses por ciclo produtivo, de acordo com o diretor da instituição. Um ciclo produtivo dura pelo menos dois meses.
O avanço da pandemia no Brasil,, com a crescente circulação do vírus, também vai permitir resultados mais rápidos para a pesquisa com as possíveis vacinas, diz Covas.
– A China não seria um bom lugar para fazer o estudo, com o número de casos diminuindo. O Brasil está em um momento propício para os estudos clínicos – afirma.
Um dos maiores desafios nessa produção deve ser a redução de pessoal devido ao distanciamento social imposto pela pandemia, aponta Zuma, do Bio-Manguinhos.
– Temos baixa de funcionários, hoje trabalhamos com pouco mais de um terço do efetivo. Novas contratações podem ser necessárias – diz.
Em São Paulo, Covas não descarta cooperações com a USP (Universidade de São Paulo) e com alunos de pós-graduação do próprio instituto.
– Temos corpo técnico de qualidade e pessoas com formação prática na fábrica. Além disso, somos uma escola que forma profissionais continuamente – afirma o cientista.
Butantan e Bio-Manguinhos também trabalham para desenvolver suas próprias vacinas.
– Esse processo vai deixar um legado na agilização do estabelecimento de plataformas para a s vacinas; vai permitir a criação de um novo modelo. Fica a lição para não deixar de lado o investimento nas instituições públicas. Vacinas são estratégicas para o país e são questão de segurança nacional – afirma Zuma.
Para Zuma, deve haver união de esforços entre as instituições públicas e empresas. Segundo ele, há uma expectativa de que Bio-Manguinhos e Butantan sejam instituições chave para preencher a lacuna da vacina na América Latina.
– Temos de somar o máximo possível para aumentar a capacidade. Não é momento de concorrência agora; a disputa é com o vírus – avaliou.
*Folhapress