O Juiz Jorge Orrevan Vaccari Filho proferiu a decisão que derruba a chapa de Tininho Batista, juntamente com seu vice, na manhã desta quarta-feira (27), em Marataízes. O atual prefeito ainda poderá recorrer, estando no cargo.
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JUSTIÇA ELEITORAL
043ª ZONA ELEITORAL DE MARATAÍZES ES
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0600111-71.2020.6.08.0043 / 043ª ZONA ELEITORAL
DE MARATAÍZES ES
REQUERENTE: DEMOCRATAS
Advogados do(a) REQUERENTE: HELIO DEIVID AMORIM MALDONADO – ES15728, LARISSA FARIA MELEIP –
ES7467
INVESTIGADO: ROBERTINO BATISTA DA SILVA, JOSE AMINTAS PINHEIRO MACHADO
Advogados do(a) INVESTIGADO: ALINE DUTRA DE FARIA – ES12031, FELIPE OSORIO DOS SANTOS – ES6381
Advogado do(a) INVESTIGADO: GEDSON BARRETO DE VICTA RODRIGUES – ES17274
SENTENÇA
1 RELATÓRIO
Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral formulada pelo PARTIDO
DEMOCRATAS em face de ROBERTINO BATISTA DA SILVA, candidato à reeleição para
Prefeito nas eleições de 2020, sendo que, posteriormente, houve a inclusão, no polo passivo, do
candidato a Vice-Prefeito, JOSÉ AMINTAS PINHEIRO MACHADO.
Em resumo, afirma a agremiação representante que o representado ROBERTINO,
desde que assumiu a chefia do Executivo Municipal, no ano de 2017, entabulou vários contratos
administrativos de publicidade institucional com emissoras de TV, emissoras de rádio e agências
de publicidade, identificados contabilmente na rubrica denominada “Função 14 – Comunicação”
e/ou na “subfunção 131 – Comunicação Social”, sendo os serviços prestados, em sua maioria,
pelas empresas Rádio Marataízes (contrato 0072/2017; ata de Registro de preço 003/2018 e seu
aditivo; contrato 208/2019) e Prisma Propaganda. Informa que nos 03 (três) primeiros anos de
sua gestão os gastos com publicidade foram: de R$ 299.811,65 (duzentos e noventa e nove mil,
oitocentos e onze reais e sessenta e cinco centavos) – no exercício de 2017; de R$ 225.062,65
(duzentos e vinte e cinco mil, sessenta e dois reais e sessenta e cinco centavos) – no exercício de
2018; e de R$ 742.065,10 (setecentos e quarenta e dois mil, sessenta e cinco reais e dez
centavos) – no exercício de 2019.
Destaca que, numa análise pormenorizada dos 02 (dois) primeiros quadrimestres de
cada ano, observa-se os seguintes gastos com propaganda institucional:
2017 – Entre 01/01/2017 a 01/09/2017 – TOTAL PAGO: R$ 109.960,79, dados estes obtidos mediante
pesquisa no Portal da Transparência utilizando a rubrica “subfunção 31”, já que na busca utilizando a
“função 04” não se encontrou qualquer valor, nem mesmo através da utilização simultânea das rubricas;
●
2018 – Entre 01/01/2018 a 01/09/2018 – TOTAL PAGO: R$ R$ 154.870,20, valores estes obtidos mediante
pesquisa da “subfunção 131 – Comunicação Social” no Portal da Transparência;
●
2019 – Entre 01/01/2019 a 01/07/2019 – TOTAL PAGO: R$ 291.451,83, valores estes obtidos no Portal da
Transparência através de pesquisa da rubrica “subfunção 131 – Comunicação Social”, além de busca
isolada de cada uma delas.
●
Ressalta que foi despendida a quantia de R$ 556.282,82 (quinhentos e cinquenta e seis mil, duzentos e oitenta e dois reais e oitenta e dois centavos) com publicidade institucional
nos dois primeiros quadrimestres dos três primeiros anos de mandato do representado
ROBERTINO, donde se chega a média de R$ 185.427,61 (cento e oitenta e cinco mil,
quatrocentos e vinte e sete reais e sessenta e um centavos) para fins do disposto na Emenda
Constitucional nº 107/2020, a qual alterou critério temporal da conduta vedada prevista no inciso
VII do art. 73 da Lei nº 9.504/97, para as eleições municipais de 2020.
Assevera que, em consulta ao Portal Transparência, vê-se que foi gasta no ano de
2020 a quantia de R$ 936.438,28 (novecentos e trinta e seis mil, quatrocentos e trinta e oito reais
e vinte e oito centavos) com propaganda institucional, onde R$ 697.362,97 (seiscentos e noventa
e sete mil, trezentos e sessenta e dois reais e noventa e sete centavos) foram despendidos até 14
de março de 2020, ou seja, em período anterior ao Decreto Municipal nº 671, de 16 de março de
2020, que declarou o estado de emergência no Município de Marataízes em virtude da pandemia
mundial da COVID 19.
Aponta que “grande parte da publicidade institucional executada pela Prefeitura
Municipal de Marataízes teve por escopo a promoção pessoal do Investigando, com prática de
propaganda extemporânea”, conforme se vê das reportagens assim intituladas:
06/04/2020 – PREFEITO TININHO DESTINA REPASSE DE R$ 3 MILHÕES PARA FUNCIONAMENTO DA UTI
DO HOSPITAL EVANGÉLICO LITORAL SUL;
●
● 27/04/2020 – Prefeito visita Mercado do Peixe da Barra do Itapemirim;
● 27/04/2020 – Tininho Batista visita reforma e ampliação do Caic da Barra;
01/05/2020 – Obras não param nem no feriado em Marataízes – […] Com pandemia e tudo, o prefeito Tininho
Batista está transformando Marataízes para muito melhor;
●
06/05/2020 – Nota de Repudio – FAKE NEWS também CONTAMINA – […] Dessa forma, desde 23/03/2020,
todo o corpo responsável da PMM, a começar pelo Prefeito Tininho Batista e o Secretário de Saúde Eraldo
Duarte, estão debruçados incansavelmente para proteger a população marataizense da pandemia;
●
15/05/2020 – EM MOMENTO ALGUM PREFEITO TININHO BATISTA CULPOU PRODUTORES DE ABACAXI
PELA CHEGADA DA PANDEMIA A MARATAÍZES.
●
Salienta, também, que “na execução do contrato com a Rádio Marataízes, em
especial no Programa ‘Café com o Prefeito’, exibido todos os sábados de 08h as 10h da manhã,
continuamente o Investigado utilizou dessa publicidade institucional para pessoalmente
autopromover-se”, havendo contra si a Representação Eleitoral nº 0600018-11.2020.6.0800043,
já julgada. Aduz, por fim, que “foram produzidos vídeos institucionais com conteúdo de
autopromoção do Investigado, sendo tudo isso compartilhado na rede social do servidor público
MARIO GOMES MOREIRA, a saber: ‘Uma nova fase em nossa educação… Parabéns Tininho,
Investindo pesado em educação’ (vídeo publicado em 29/abril/2020), ‘ESF Barra Tininho que
fez… uma gestão comprometida com a saúde pública – essa e a marca da gestão Tininho Batista’
(vídeo publicado em 01/maio/2020), ‘investimento em macrodrenagem – Prefeito Tininho Faz’
(vídeo publicado em 04/maio/2020) e ‘marca de uma gestão comprometida – Parabéns Prefeito
Tininho Batista” (vídeo publicado em 05/maio/2020)’”.
Ao término de seu arrazoado, requer seja julgada procedente a presente AIJE, com
a consequente aplicação de multa e cassação do futuro registro, diploma ou mandato do
representado ROBERTINO BATISTA DA SILVA.
Logo em seguida ao ajuizamento da demanda, o representante apresentou emenda
à petição inicial, argumentando que deve ser “acrescentada a existência de mais um contrato e
aditivo com a rádio Marataízes FM, qual seja o contrato 0012/2019 no valor de R$ 292.209,60
(Duzentos e noventa e dois mil, duzentos e nove reais e sessenta centavos) e seu aditivo
correlato na ordem de R$ 72.999,51 (Setenta e dois mil, novecentos e noventa e nove reais e
cinquenta e um centavos), cujo instrumento não foi localizado”.
O representado habilitou-se nos autos (ID 79467 55), apresentando defesa (ID
79729 99), alegando que a peça inicial apresenta os seguintes erros: 1) filtragem das despesas e
os gastos com publicidade institucional por PAGAMENTOS, vez que o correto seria filtrar por
LIQUIDAÇÕES para se apurar “a média dos gastos dos 2 (dois) primeiros quadrimestres dos 3 (três) últimos anos que antecedem ao pleito”, porque, no seu entender, o inciso VII do artigo 73
da LE refere-se às DESPESAS LIQUIDADAS; 2) na aferição de gastos com publicidade
institucional até 15/08/2020 foram incluídos pagamentos de despesas realizadas em exercícios
anteriores; 3) não foram contabilizadas liquidações de despesas constantes no Portal
Transparência, como, por exemplo, a subfunção 695, a qual contabiliza liquidações de ações
desenvolvidas no sentido de divulgar os atrativos turísticos, planejar e fortalecer o
desenvolvimento do turismo interno no país ou na unidade da federação e da captação de turistas
estrangeiros; 4) na “filtragem de informações” feita pelo representante não foram contabilizados
os valores de publicidade institucional contratados com a empresa TV GAZETA SUL, do ano de
2017 até 20/03/2020, o que totaliza R$ 132.376,67 (cento e trinta e dois mil, trezentos e setenta e
seis reais e sessenta e sete centavos); 5) no cálculo do representante não são consideradas as
Despesas do Exercício Anterior (DEA), pelo que “não se pode, simplesmente, pegar apenas o
relatório de liquidações do ano de 2020 e, automaticamente, considerá-lo como gasto ou despesa
com publicidade institucional, para fins eleitorais do art. 73, inciso VII, da Lei Federal nº
9.504/1997, sem desconsiderar os 22 (vinte e dois) processos de liquidação que tratam de
DESPESAS DO EXERCÍCIO ANTERIOR – DEA, justamente por conta da dinâmica da Agência de
Publicidade e sem qualquer conteúdo tendente a afetar a igualdade de oportunidades entre
candidatos”, sendo que as ações publicitárias que ocorreram no final do exercício de 2019 não
tiveram repercussão no exercício de 2020, muito menos afetam a igualdade entre os candidatos,
pois “se tratavam de web banner’s, anúncio na rádio, transmissão na televisão, matérias em
jornais físicos ou virtuais de ações bem pontuais”.
Afirma, ainda, que, em função das Despesas do Exercício Anterior (DEA), devem
ser realizadas as seguintes inclusões e deduções nos cálculos: a) em 2017 “deve ser INCLUÍDO
no montante gasto o valor de R$ 168.573,59, da empresa RÁDIO MARATAÍZES FM LTDA.,
conforme o Processo Administrativo nº 34.061/2017, uma vez que referente a serviços
efetivamente realizados em AGO/2017 e somente foram processados após os 02 (dois) primeiros
quadrimestres de 2017; b) em 2018, “deve ser DEDUZIDO do montante gasto o valor – R$
15.000,00, da empresa TV GAZETA SUL, conforme o Processo Administrativo nº 43.401/2017,
uma vez que dá conta que a liquidação nº 1247/2018, cujo empenho é o nº 5302/2017, não
pertence aos 02 (dois) primeiros quadrimestres de 2018, pois se trata de DESPESA DO
EXERCÍCIO ANTERIOR – DEA”; c) em 2019 “deve ser INCLUÍDO no montante gasto o valor de
R$ 22.957,38, da empresa RÁDIO MARATAÍZES FM LTDA., conforme o Processo Administrativo
nº 36.736/2019, uma vez que se refere a serviços efetivamente realizados em AGO/2019 e
somente foram processados após os 02 (dois) primeiros quadrimestres de 2019”, bem como
“deve ser DEDUZIDO do montante gasto o valor – R$ 14.504,00, da empresa TV GAZETA SUL,
conforme o Processo Administrativo nº 41.156/2018, uma vez que dá conta que a liquidação nº
65/2019, cujo empenho é o nº 6635/2018, não pertence aos 02 (dois) primeiros quadrimestres de
2019, pois se trata de DESPESA DO EXERCÍCIO ANTERIOR – DEA”.
Sustenta que, com base na data em que a despesa é efetivamente contratada
(publicidade institucional), nos dois primeiros quadrimestres do ano de 2017 foi liquidada a
quantia de R$ 382.729,65 (trezentos e oitenta e dois mil, setecentos e oitenta e dois reais e
sessenta e cinco centavos); ao passo que nos dois primeiros quadrimestres do ano de 2018 foi
liquidado o montante de R$ 285.272,20 (duzentos e oitenta e cinco mil, duzentos e setenta e dois
reais e vinte centavos) e no dois primeiros quadrimestres de 2019 a importância de R$
461.695,21 (quatrocentos e sessenta e um mil, seiscentos e noventa e cinco reais e vinte e um
centavos), alcançando, para fins da legislação eleitoral, a média de R$ 376.565,69 (trezentos e
setenta e seis mil, quinhentos e sessenta e cinco reais e sessenta e nove centavos), valor este
que a Administração Pública Municipal estava autorizada a gastar com publicidade institucional,
no período de 01/01/2020 até 15/08/2020, e, neste intervalo, foi gasto efetivamente o montante
de R$ 353.621,58 (trezentos e cinquenta e três mil, seiscentos e vinte e um reais e cinquenta e
oito centavos), mantendo-se dentro do limite permitido.
Assevera que na contratação da empresa RÁDIO MARATAÍZES FM LTDA
(Contrato Administrativo nº 12/2019) – objeto da emenda à inicial – o montante entabulado em 2019 foi de R$ 292.209,60 (duzentos e noventa e dois mil, duzentos e nove reais e sessenta
centavos), mas no período de 01/01/2019 até 01/09/2019, foi despendida “apenas” a importância
de R$ 268.915,83 (duzentos e sessenta e oito mil reais e oitenta e três centavos).
Por fim, destaca que “os serviços de publicidade institucional realizados pela
Agência de Publicidade estão diretamente relacionados com a distribuição de material entre os
veículos de comunicação, ao passo que as coberturas apresentadas são de ações do Setor de
Comunicação que, de certa forma, criam pequeno destaque ao Representado”, tratando-se de
“um destaque inerente ao seu cargo de Chefe do Executivo Municipal, permitido e tolerado pela
Legislação Eleitoral pois praticado em todas as esferas de Poder”, pois do “contrário, e se assim
não o fosse, certamente o Representante ou o Ministério Público Eleitoral já teriam movido esta
Justiça Especializada, o que, de fato, não ocorreu”, pugnando, assim, pela “desconsideração dos
reforços inócuos de tese do Representante, os quais, não há dúvidas de que este r. Juízo
Eleitoral está atento e prevenido diante de tal artifício, fazendo toda a distinção e independência
de situações, como já o fez na Representação nº 0600100-42.2020.6.08.0043”.
Em sua manifestação (ID 11626294), o Ministério Público Eleitoral pugnou pela
rejeição da alegação do representando, compreendendo que, no cálculo para a aferição da
média, deverá ser computado o valor de R$ 582.816,70 (quinhentos e oitenta e dois mil,
oitocentos e dezesseis reais e setenta centavos), liquidado no período de 01/01/2020 a
15/08/2020, referente aos serviços prestados pela empresa Prisma Propaganda Ltda., no ano de
2019, pois a contratação se deu em 26/11/2019, isto é, 35 (trinta e cinco) dias antes do término
de 2019, e 02 (dois) dias após a assinatura do contrato Administrativo nº 249/2019, o Município
de Marataízes/ES realizou o empenho n° 0007927/2019, no valor de R$ 800.000,00 (oitocentos
mil reais), donde R$ 582.816,70 (quinhentos e oitenta e dois mil, oitocentos e dezesseis reais e
setenta centavos), foram liquidados por serviços de propaganda prestados nos últimos 35 (trinta e
cinco) dias do ano de 2019, fazendo com que a empresa recebesse uma média de R$ 16.651,91
(dezesseis mil, seiscentos e cinquenta e um reais e noventa e um centavos) por dia de contrato
com o Município de Marataízes, restando “totalmente inconcebível, desproporcional e
desarrazoado a realização de gastos de publicidade, em 35 (trinta e cinco) dias, em tamanho
volume”, tendo o objeto contratado tido grande impacto no de 2020, tendendo a afetar a
igualdade de oportunidades entre os futuros candidatos das eleições daquele ano.
Acerca da aludida repercussão das ações publicitárias no pleito, pontua o parquet
que “69% dos gastos de publicidade do período em comento, isto é, R$ 403.390,88 (quatrocentos
e três mil, trezentos e noventa e oito reais e oitenta e oito centavos), não dizem respeito às
comemorações do final do ano do município ou à temas de turismo local”, tratando-se, pois, de
“propagandas sobre outros temais, tais como, ‘Anuncio campanha infraestrutura’, ‘Anuncio de
merenda escolar’, ‘Banner topo campanha infraestrutura’, “Banner pre index campanha UPA’,
‘Banner topo UPA’, ‘Campanha infraestrutura’, ‘Campanha institucional’, ‘Campanha merenda
escolar’, ‘Campanha UPA’, ‘Cobertura Divulgação em site campanha infraestrutura’, ‘Divulgação
site merenda escolar’, ‘Modernização da identidade visual da frota municipal’, ‘Publicação do site
merenda escolar’, ‘publicação em site de campanha infraestrutura’, ‘Publicação site UPA’, ‘Spot de
merenda escolar’, ‘Spot campanha infraestrutura’, ‘Spot mais infraestrutura’, ‘Super banner
campanha infraestrutura’, ‘Video e Spot campanha UPA’, ‘VT campanha infraestrutura’, ‘VT
merenda escolar’, ‘VT UPA’, ‘Web Banner Merenda escolar’, Web Banneer UPA’ e ‘Web banner
campanha infraestrutura’, restando “patente que as condutas praticadas pelo requerido tinham o
objetivo de mascarar, fraudar, burlar, o espírito da vedação legal prevista pelo art. 73, inc. VII, da
Le n° 9.504/97, porquanto, no apagar das luzes do ano de 2019, promoveu a efetiva realização
de publicidade em valor elevadíssimo, com cunho promocional, às vésperas do início do ano
eleitoral, quanto estaria legalmente impedido de realizar os sobreditos gastos acima da média,
nos termos legais”.
Conclui, ao final, pela procedência da demanda, pois “incorreu o requerido na
conduta vedada acima citada, ao ter, no período de 01/01/2020 à 15/08/2020, os gastos
liquidados com publicidade institucional realizada pelos órgãos públicos ou por suas respectivas entidades da administração indireta, no valor de R$ 936.438,28 (novecentos e trinta e seis mil,
quatrocentos e trinta e oito reais e vinte e oito centavo), superiores, portanto, à média dos gastos
dos 2 (dois) primeiros quadrimestres dos 3 (três) últimos anos que antecedem ao pleito, no valor
de R$ 376.656,69 (trezentos e setenta e seis mil, seiscentos e cinquenta e seis reais e sessenta e
nove centavos)”.
O despacho de ID 14027 585 autorizou a inclusão do candidato à Vice-Prefeito
(JOSÉ AMINTAS PINHEIRO MACHADO) no polo passivo que, cientificado, apresentou defesa no
ID 24410778, reiterando em grande parte a defesa do candidato a Prefeito, pugnando pelo não
recebimento da AIJE ou, alternativamente, a procedência parcial do pedido, ponderando que
“nem toda conduta vedada e nem todo abuso do poder político acarretam a automática cassação
de registro ou de diploma”.
As partes não formularam pedido de produção de prova oral.
Conforme ID’s 44173060 e 44173061, o segundo colocado nas eleições para o
cargo de Chefe do Executivo Municipal, Sr. Antonio Bitencourt, requereu sua admissão no
processo, na qualidade de assistente do autor, fundamentando seu pleito nas letras do artigo 119
do CPC – “pendendo causa entre 2 (duas) ou mais pessoas, o terceiro juridicamente interessado
em que a sentença seja favorável a uma delas poderá intervir no processo para assisti-la”. Na
ocasião, requereu o julgamento antecipado do mérito, ratificando a manifestação ministerial.
O despacho de ID 50173181 determinou a intimação das partes para dizerem a
respeito do pedido de assistência.
A defesa do representado ROBERTINO apresenta uma espécie de memoriais no ID
53914852, requerendo, ainda, a oitiva das testemunhas GABRIEL PAULINO GOMES RG e
FERNANDO SANTOS MOURA, sem, contudo, especificar a razão de não tê-los relacionado
oportunamente.
Por seu turno, em sua manifestação de ID 54303985 o MPE não se opôs ao
ingresso de Antônio Bitencourt na qualidade de assistente, uma vez demonstrado o interesse
jurídico, consoante art. 119 e seguintes do CPC, pugnando, ainda, pelo julgamento antecipado da
lide.
Certidão de ID 55080234 atestando a fluência do prazo de manifestação pelas
partes, em relação ao último despacho dos autos.
É o que cabia relatar. DECIDO.
De saída, com base nas letras do artigo 119 do CPC, admito o Sr. Antonio
Bitencourt na qualidade de assistente do autor.
No tocante ao pedido de produção de prova oral formulado pela defesa de Robertino
Batista da Silva, indefiro-o, notadamente em função de que a admissão do assistente não trouxe
nenhum elemento novo no aspecto probante que já não pudesse ter sido objeto de análise e
requerimento quando do oferecimento da defesa; não foi justificada a relevância da prova oral
para a elucidação dos fatos; e, ainda que fosse, os requeridos admitem e especificam os
contratos e as liquidações (que, após a resposta, não foram impugnadas em “réplica”), pelo que
as questões controvertidas são meramente de direito, comportando o feito imediato julgamento,
nos moldes do artigo 355, I, do CPC.
2 FUNDAMENTAÇÃO
No que toca à Ação Judicial de Investigação Eleitoral (AJIE) prevista no art. 22 da
Lei Complementar nº 64/1990, cumpre esclarecer que esta tem por escopo apurar o uso indevido,
desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade ou a utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político.
Vejamos:
“[…].
Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral
poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional,
relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de
investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou
do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação
social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:
[…].”
Como visto, a matéria controvertida nos presentes autos diz respeito, basicamente,
à análise da existência de atos caracterizadores de abuso de poder político consistentes em
gastos liquidados com propaganda institucional até 15/08/2020 superiores a média dos 02 (dois)
primeiros quadrimestres dos 3 (três) últimos anos que antecedem ao pleito, bem como ao uso de
“propaganda institucional” para autopromoção.
2.1 – DA INFRINGÊNCIA AO ART. 73, VII, DA LEI Nº 9.504/97, COM AS
ALTERAÇÕES INSERIDAS PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 107/2020:
Segundo se depreende do 73, VII, da Lei nº 9504/97, quando trata “Das Condutas
Vedadas aos Agentes Públicos em Campanhas Eleitorais”:
“[…].
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas
tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
[…].
VII – realizar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos
órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da
administração indireta, que excedam a média dos gastos no primeiro semestre dos três
últimos anos que antecedem o pleito;
[…].”
§ 5º Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos do caput e no § 10, sem
prejuízo do disposto no § 4o, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará
sujeito à cassação do registro ou do diploma.
[…].”
Dita norma foi praticamente replicada pelo Colendo Tribunal Superior Eleitoral no
artigo 83, VII, da Resolução n° 23.610/2019, referente às eleições de 2020, valendo destacar,
ainda, que, em razão da pandemia do Covid-19, a Emenda Constitucional nº 107/2020 adiou as
eleições municipais de outubro de 2020 e os prazos eleitorais respectivos, alterando, inclusive, o
critério temporal para aferição da conduta vedada prevista no inciso VII do art. 73 da Lei nº
9.504/97, conforme se observa do seu artigo 1º, § 3º, VII, que abaixo destaco:
“[…].
Art. 1º As eleições municipais previstas para outubro de 2020 realizar-se-ão no dia 15
de novembro, em primeiro turno, e no dia 29 de novembro de 2020, em segundo turno,
onde houver, observado o disposto no § 4º deste artigo.
[…].
§ 3º Nas eleições de que trata este artigo serão observadas as seguintes disposições:
[…].
VII – em relação à conduta vedada prevista no inciso VII do caput do art. 73 da Lei nº
9.504, de 30 de setembro de 1997, os gastos liquidados com publicidade
institucional realizada até 15 de agosto de 2020 não poderão exceder a média
dos gastos dos 2 (dois) primeiros quadrimestres dos 3 (três) últimos anos que
antecedem ao pleito, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim
reconhecida pela Justiça Eleitoral;
[…].”
Conforme lições de José Jairo Gomes1
, que abaixo destaco, quando trata das ações
judiciais eleitorais e, em especial, da ação por conduta vedada a agentes públicos, referido autor
enfatiza o conceito de abuso de poder político e aponta o bem jurídico protegido pela norma dos
artigos 73 e 78 da LE, qual seja, a igualdade no certame/isonomia nas disputas eleitorais:
21.7 AÇÃO POR CONDUTA VEDADA A AGENTES PÚBLICOS – LE, ARTIGOS 73
A 78
21.7.1 Caracterização da conduta vedada
Tem-se salientado a unicidade do conceito de abuso de poder, conquanto sua
concretização possa dar-se a partir de diferentes situações ocorridas na realidade
fenomênica, apresentando, ainda, diversidade de efeitos na esfera jurídica. Conforme
lição clássica, trata-se do mau uso de poder – ou de direito subjetivo – detido pelo
agente, que desborda do que é comum e da normalidade.
Caracteriza-se o abuso de poder político pela exploração da máquina
administrativa ou de recursos estatais em proveito de candidatura, ainda que
aparentemente haja benefício à população. Distingue-se do abuso de poder
econômico, porquanto neste em princípio se encontra ausente a atuação de agente
estatal.
Entre as inumeráveis situações que podem denotar uso abusivo de poder
político ou de autoridade, o legislador destacou algumas em virtude de suas
relevâncias e reconhecida gravidade no processo eleitoral, interditando-as
expressamente. São as denominadas condutas vedadas, cujo rol encontra-se nos
artigos 73 a 78 da Lei nº 9.504/97. Trata-se de numerus clausus, não se admitindo
acréscimo no elenco legal. Sobretudo em razão de seu caráter sancionatório, as regras
em apreço não podem ser interpretadas extensiva ou ampliativamente, de modo a
abarcar situações não normatizadas.
Tal qual ocorreu com o artigo 41-A da Lei das Eleições (que sanciona a
captação ilícita de sufrágio), também os artigos 73, § 5º, 74 e 77, parágrafo único,
foram acoimados de inconstitucionais na parte em que instituem as sanções de
cassação de registro de candidatura ou diploma, as quais, segundo se alega,
implicariam inelegibilidade. Esta, nos termos do artigo 14, § 9º, da Constituição Federal
só pode ser instituída por lei complementar, não por lei ordinária, como são as Leis nº
9.504/97 e nº 9.840/99 (que alterou a redação do aludido § 5º do art. 73).
Não obstante, o conceito de inelegibilidade é normativo. Como tal, consideramse apenas as hipóteses que a lei expressamente prescreve, a exemplo das descritas
no artigo 1º, da LC nº 64/90. Nesse sentido, pacificou-se o entendimento segundo o
qual os artigos 73, § 5º, 74 e 77, parágrafo único, da Lei nº 9.504/97, encontram-se em
perfeita harmonia com a Lei Magna, já que não contêm hipótese de inelegibilidade.
[…].
No entanto, essa discussão deixou de ter relevância, já que a inelegibilidade foi
expressamente introduzida nessa seara pela alínea j, I, artigo 1º, da LC nº 64/90
(inserida pela LC nº 135/2010). Por essa regra, é inelegível, por oito anos a contar da
data das eleições, quem tiver o registro ou o diploma cassados, em decisão transitada
em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por conduta vedada
aos agentes públicos em campanhas eleitorais. Assim, a procedência do pedido na
demanda em apreço implica a automática inelegibilidade do réu.
A conduta vedada traduz a ocorrência de ato ilícito eleitoral. Uma vez caracterizada, com a concretização de seus elementos, impõe-se a responsabilização
tanto dos agentes quanto dos beneficiários do evento.
Estabelece o aludido artigo 73 que as condutas elencadas “são proibidas aos
agentes públicos, servidores ou não”, porque tendem “a afetar a igualdade de
oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais”.
[…].
Como corolário da conduta vedada, tem-se o ferimento do bem jurídico
protegido pela norma em apreço. Conforme se disse há pouco, o caput do artigo 73 da
LE esclarece que, aos agentes públicos, é proibida a realização dos comportamentos
que especifica, porque tendem “a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos
nos pleitos eleitorais”. Aí está o bem jurídico que a regra em apreço visa proteger: a
igualdade de oportunidades – ou de chances – entre candidatos e respectivos partidos
políticos nas campanhas que desenvolvem. Haveria desigualdade se a Administração
estatal fosse desviada da realização de seus misteres para auxiliar a campanha de um
dos concorrentes, em odiosa afronta aos princípios da moralidade e impessoalidade.
Por óbvio, as campanhas são sempre desiguais, sobretudo porque algumas são
milionárias, pois contam com o apoio da elite econômico-financeira, ao passo que
outras chegam a ser franciscanas; alguns candidatos são mais carismáticos, outros
menos. Mas não é dessa ordem a desigualdade que o presente dispositivo visa coibir.
O que se combate, aqui, é o desequilíbrio patrocinado com recursos do erário. Trata-se
de dinheiro público, oriundo da cobrança de pesados tributos, que direta ou
indiretamente é empregado para irrigar ou alavancar campanhas eleitorais. Daí a
ilicitude da distorção provocada por essa situação, que a um só tempo agride a
probidade administrativa, a moralidade pública e a igualdade no pleito.
Tendo em vista que o bem jurídico protegido é a igualdade no certame, a
isonomia nas disputas, não se exige que as condutas proibidas ostentem aptidão ou
potencialidade para desequilibrar o pleito, feri-lo ou alterar seu resultado (TSE – AgRREspe nº 59030/TO – DJe, t. 222, 24-11-2015, p. 190-191; TSE – AgR-REspe nº
20280/RJ – DJe 1-7-2015, p. 5).
Ademais, é desnecessária a demonstração do concreto comprometimento ou
do dano efetivo às eleições, já que a “só prática da conduta vedada estabelece
presunção objetiva da desigualdade” (TSE – Ag. nº 4.246/MS – DJ 16-9-2005, p. 171).
Basta, portanto, que se demonstre a mera realização do ato ilícito (TSE – AgR-REspe
nº 20871/RS – DJe, t. 149, 6-8-2015, p. 53-54; TSE – REspe nº 45060/MG – DJe, t.
203, 22-10-2013, p. 55-56).
O que se impõe para a perfeição da conduta vedada é que, além de ser típico
e subsumir-se a seu respectivo conceito legal, o evento considerado tenha aptidão para
lesionar o bem jurídico protegido, no caso, a igualdade na disputa, e não propriamente
as eleições como um todo ou os seus resultados.
[…].
No que concerne à sanção, há que se realizar juízo de proporcionalidade
quando de sua imposição. O fato de uma conduta se enquadrar como vedada a agente
estatal não significa que sempre e necessariamente leve à cassação de diploma. Na
verdade, a sanção deve ser ponderada em função da lesão perpetrada ao bem jurídico.
Assim, uma conduta vedada pode ser sancionada com multa, com a só determinação
de cessação ou mesmo com a invalidação do ato inquinado. Veja-se nesse sentido:
“[…] 2. Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda conduta vedada e nem
todo abuso do poder político acarretam a automática cassação de registro ou de diploma,
competindo à Justiça Eleitoral exercer um juízo de proporcionalidade entre a conduta praticada e a
sanção a ser imposta. […]” (TSE – REspe nº 33.645/SC – DJe, t. 73, 17-4-2015, p. 45-46).
“[…] 4. A penalidade pela prática de conduta vedada deve ser proporcional à sua gravidade. Na
espécie, a cassação do diploma e a multa de 80.000 (oitenta mil) UFIR são desproporcionais, pois
a autorização de propaganda institucional em período vedado não resultou em comprometimento
relevante da igualdade entre os candidatos. 5. Recurso especial eleitoral parcialmente provido para
afastar a sanção de inelegibilidade, excluir a cassação do diploma dos recorrentes e reduzir a
multa para 20.000 (vinte mil) UFIR” (TSE – REspe nº 7832-05/RJ – DJe 6-8-2014). À consideração de que as hipóteses legais de conduta vedada constituem
espécie do gênero “abuso de poder político”, o fato que as concretize também pode ser
apreciado como abuso de poder – político ou de autoridade – coibido pelos artigos 19 e
22, XIV, da LC nº 64/90. Para que isso ocorra, será mister que a conduta vedada, além
de afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos, também seja de tal
magnitude que fira a normalidade ou o equilíbrio do pleito. Assim, o mesmo evento
atinge dois bens juridicamente protegidos. …
[…].”
E, especificamente ao tratar das despesas excessivas com propaganda institucional
previstas no artigo 73, VII, da LE (sem considerar as alterações levadas a efeito pela EC nº
107/2020), o doutrinador prossegue, conforme trechos sem destaques no original2
:
21.7.2.11 Despesas excessivas com propaganda institucional – art. 73, VII
O artigo 73, VII, da LE proíbe
“realizar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos órgãos públicos
federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que
excedam a média dos gastos no primeiro semestre dos três últimos anos que antecedem o pleito;”
A redação desse dispositivo foi dada pela Lei nº 13.165/2015.
Foi visto que o artigo 73, VI, alínea b, da LE proíbe a realização de propaganda
institucional no trimestre anterior ao pleito (que compreende os meses de julho, agosto
e setembro), salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim
reconhecida pela Justiça Eleitoral.
O presente inciso VII tem em mira o período anterior a esse trimestre,
compreendendo o primeiro semestre do ano eleitoral, o que corresponde aos meses de
janeiro a junho.
Nesse semestre, é proibida a realização de despesas com publicidade dos
órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da
Administração indireta, “que excedam a média dos gastos no primeiro semestre dos
três últimos anos que antecedem o pleito”.
Visa-se refrear gastos excessivos ou desproporcionais com a realização de
publicidade por órgãos públicos em ano eleitoral, procurando mantê-los dentro da
média dos respectivos semestres anteriores.
Acolheu-se, portanto, o critério da média semestral de gastos, em detrimento
das médias mensal e anual. Para se calcular a média semestral, basta dividir por três o
montante dos gastos havidos nos três primeiros semestres dos anos anteriores.
Antes da alteração do vertente inciso VII pela Lei nº 13.165/2015, a solução
nele veiculada já havia sido acolhida em pioneiro precedente do TRE de Santa
Catarina, a ver:
“A teor do inciso VII do artigo 73 da Lei nº 9.504/1997, os agentes públicos, no primeiro semestre
do ano da eleição, não podem liquidar recursos referentes a despesas com publicidade dos órgãos
públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta,
que excedam a média semestral dos gastos liquidados nos 03 (três) últimos anos que antecedem
o pleito ou do último ano imediatamente anterior à eleição. […]” (TRE/SC – RDJE nº 33645 – DJe, t.
2, 9-1-2013, p. 7-8).
Mas esse entendimento foi rechaçado pelo Tribunal Superior Eleitoral, o qual
propugnou como mais relevante a realização de juízo de proporcionalidade, juízo esse
que deve ser realizado in concreto, à luz das circunstâncias fáticas. Confira-se:
“[…] O critério a ser utilizado não pode ser apenas as médias anuais, semestrais ou mensais, nem
mesmo a legislação assim fixou, mas o critério de proporcionalidade. O acórdão regional
demonstra que os gastos no primeiro semestre de 2012 (R$1.340.891,95 – um milhão, trezentos e
quarenta mil, oitocentos e noventa e um reais e noventa e cinco centavos) representaram
aproximadamente: 68% dos gastos realizados em 2011 (R$1.958.977,91 – um milhão, novecentos
e cinquenta e oito mil, novecentos e setenta e sete reais e noventa e um centavos), 24% a mais do que os realizados em 2010 (R$1.079.546,97 – um milhão, setenta e nove mil, quinhentos e
quarenta e seis reais e noventa e sete centavos) e 94% dos gastos do ano de 2009
(R$1.415.633,93 – um milhão, quatrocentos e quinze mil, seiscentos e trinta e três reais e noventa
e três centavos), o que dispensa maiores cálculos matemáticos acerca da evidente
desproporcionalidade das despesas com publicidade institucional no primeiro semestre de 2012, a
revelar quebra da igualdade de chances. Some-se a isso o fundamento ressaltado pelo acórdão
regional de que ‘os números demonstram que os gastos em excesso foram bastante expressivos,
superiores a 80% (oitenta por cento) do valor autorizado por lei, o que torna a conduta ainda mais
grave’ (fl. 356). […]. 6. Desprovimento do recurso. Decisão: O Tribunal, por unanimidade,
desproveu o recurso e revogou a liminar deferida à fl. 652v. pela presidência do TRE de Santa
Catarina, nos termos do voto do Relator.” (TSE – REspe nº 33.645/SC – DJe, t. 73, 17-4-2015, p.
45-46).
Outro importante ponto a ser esclarecido na regra em comento diz respeito à
definição do ato relevante para a caracterização da conduta vedada. O texto legal
emprega as expressões “realizar despesas” e “gastos”. Sabe-se, porém, que despesa é
termo genérico, denotando os procedimentos de empenho, liquidação e pagamento.
Pelo empenho, é autorizada a contração de uma obrigação e a realização de uma
despesa, indicando-se no orçamento montante pecuniário bastante para o seu
adimplemento. Já pela liquidação se afere a certeza da obrigação, apurando-se sua
existência e determinando-se o seu conteúdo ou o quantum de seu objeto. Nesse
sentido, dispõe o artigo 63 da Lei nº 4.320/64 que “a liquidação da despesa consiste na
verificação do direito adquirido pelo credor, tendo por base os títulos e documentos
comprobatórios do respectivo crédito”. Assim, é no procedimento de liquidação que
se apura se o serviço foi prestado, se a obra foi realizada, se os produtos foram
entregues. Feita a liquidação, é expedida ordem para pagamento do credor. Na
definição do artigo 64 da Lei nº 4.320/64: “A ordem de pagamento é o despacho
exarado por autoridade competente, determinando que a despesa seja paga”. Por
óbvio, o pagamento – ou o adimplemento do credor – depende da existência de
recursos financeiros (= dinheiro) no órgão público contratante.
Diante disso, qual o exato significado das expressões “realizar despesas” e
“gastos” no enfocado inciso VII do artigo 73 da LE? Certamente não significa empenho,
pois esse é apenas uma previsão de despesa no orçamento público. O só empenho da
despesa não implica a realização da obrigação respectiva, podendo aquele ato vir a ser
desfeito posteriormente. Tampouco pode significar pagamento, pois este depende da
existência de disponibilidade financeira no órgão; de sorte que, embora a parte
contratada cumpra a obrigação, esta pode não ser adimplida pelo órgão público
contratante. Em tal quadro, o inciso VII do artigo 73 da LE só pode se referir às
despesas liquidadas, ou seja, às obrigações já adimplidas pela parte contratada,
a qual tem direito subjetivo ao pagamento. Deveras, a liquidação implica o
reconhecimento oficial de que a prestação obrigacional foi realizada, ou seja, de que os
bens foram entregues e o serviço contratado devidamente prestado.
Destarte, as “despesas” e “gastos” a serem considerados são aqueles
liquidados, ainda que as respectivas obrigações não tenham sido adimplidas ou pagas
ao credor pelo órgão contratante.
Nesse contexto, torna-se cristalino o motivo pelo qual os governantes
empenham-se em manter altos investimentos em publicidade institucional ao longo de
seus mandatos, concentrando elevadíssimas somas no ano imediatamente anterior ao
do pleito, bem como no primeiro semestre do ano em que as eleições são realizadas.
Diante da sofisticação das técnicas de marketing, é ingenuidade acreditar que a
propaganda institucional não promove sobremaneira a imagem e os feitos de quem a
autoriza.
De qualquer sorte, havendo excesso abusivo de despesas com publicidade
institucional, exsurge a responsabilidade do agente político. Essa responsabilidade
independe de que ele seja o ordenador da respectiva despesa ou o subscritor do
contrato de publicidade. O benefício decorrente da irregularidade em apreço é
presumido de forma absoluta. Isso porque “a estratégia dessa espécie de propaganda
cabe sempre ao chefe do Executivo, mesmo que este possa delegar os atos de sua
execução a determinado órgão de seu governo” (TSE – REspe nº 21.307/GO – DJ v. 1,
6-2-2004, p. 146).
[…].”
Como visto, a compreensão da doutrina citada é a de que o inciso VII do artigo 73 da LE se refere a “despesas liquidadas”, ou seja, às obrigações já adimplidas pela parte
contratada, sendo que o próprio TSE assentou entendimento no sentido de que “a melhor
interpretação da regra do art. 73, VII, da Lei n° 9.504197, no que tange à definição – para fins
eleitorais – do que sejam despesas com publicidade, seja considerar o momento da liquidação, ou
seja, do reconhecimento oficial de que o serviço foi prestado – independentemente de se verificar
a data do respectivo empenho ou do pagamento.” (TSE, REspe n° 679-94.2012.6.26.0212/SP,
Rel. Min. Henrique Neves da Silva. j. 24/10/2013)
Nesse passo, resta-nos analisar, segundo a prova documental constante dos autos,
se efetivamente a parte requerida descumpriu, em ano eleitoral, a conduta vedada com gastos de
publicidade institucional superiores a média dos últimos anos (agora, segundo os marcos
estabelecidos pela EC nº 107/2020) e, consequentemente, se tal proceder lesionou o bem jurídico
protegido, qual seja, a igualdade na disputa, além de definirmos quais os reflexos no campo da
responsabilidade do agente político.
De início, rejeito a alegação autoral que pretende revisitar os fundamentos da
demanda que apurou a ocorrência de propaganda irregular antecipada em benefício do requerido
ROBERTINO, demanda esta movida, em especial, em desfavor do seu apoiador MARIO GOMES
MOREIRA, pois, apesar deste juízo ter acolhido o pedido, nosso E. TRE/ES proveu o recurso
interposto pela parte requerida nos autos do processo nº 0600025-03.2020.6.08.0043 e reformou
o julgado, não reconhecendo irregularidades nas postagens.
Quanto aos demais argumentos, adianto que o caso é de procedência, a vista da
constatação da existência de despesas excessivas liquidadas com propaganda institucional!
Afinal, o primeiro elemento de prova que devemos considerar está ainda na fase da
programação orçamentária do Município com gastos de publicidade institucional, pois, como bem
pontuado pela parte autora em sua inicial, “o planejamento por parte do Investigado de tal
exorbitância de gastos com publicidade institucional pode ser atestado pelo exame das Leis
Orçamentárias do Município de Marataízes, as quais apresentam evolução meteórica das
despesas com publicidade institucional (doc10)”, quando se observou que o orçamento: 1) para o
ano de 2017, aprovado em 2016, perfez o total de R$ 100.000,00; 2) para o ano de 2018,
aprovado em 2017, foi na ordem de R$ 110.000,00: 3) de 2019, apesar de ter se elevado um
pouco, totalizou o valor de R$ 147.000,00.
Já no orçamento de 2020, aprovado em 2019, ou seja, na sequência da
programação financeira de despesas, percebe-se claramente que os gastos com publicidade
institucional foram intencionalmente ampliados para a importância de R$ 800.000,00, para serem
executados em ano eleitoral e, ainda que o representado não tenha, na ocasião da proposição do
orçamento, justificado o motivo pelo qual houve tal vertiginoso aumento, os elementos coligidos
aos autos nos fazem concluir, segundo as palavras da parte autora, que “essa concentração
absurda e desproporcional de gastos com publicidade institucional para o ano de 2020 foi
engendrada dolosamente para alavancar a imagem do gestor Réu”.
Repisa-se: comparado ao exercício de 2017 (ID’s 3994891 a 3994894), o orçamento
com “publicação e divulgação de atos do Poder Executivo” e “Comunicação Governamental” do
ano eleitoral de 2020 foi elevado em 08 (oito) vezes, ou seja, de R$ 100.000,00 (cem mil reais)
para R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais), ao passo que, além de descumprir a previsão
orçamentária do ano de 2020, o gestor contratou empresa por valor correspondente quase ao
dobro (R$1.500.000,00) e também liquidou parte dos valores, por serviços supostamente
prestados pela referida empresa ainda no exercício de 2019!
É certo que o orçamento do Município é meramente autorizativo, ou seja, não obriga
o Poder Executivo a gastar todas as verbas autorizadas na Lei Orçamentária Anual (LOA),
servindo, assim, como orientação, diretriz, para a execução das despesas.
Entretanto, as demais provas dos autos ratificam essa presunção de aumento
proposital e irregular da previsão de gastos com publicidade institucional, mesmo porque, apenas
a Concorrência nº 004/2019 – Contrato nº 0249/2019 – de 26 de novembro de 2019, vencida pela
empresa de nome fantasia Prisma Propaganda, teve valor global estimado em R$ 1.500.000,00
(hum milhão e quinhentos mil reais), pelo prazo de 12 (doze) meses (ID 3993972).
No aspecto dos gastos propriamente ditos, a parte requerida impugna algumas
alegações iniciais, sustentando que, além das despesas com Comunicação Social (Subfunção
131), não foram contabilizadas liquidações de despesas com a divulgação do Turismo
(Subfunção 695), o que alteraria os valores médios de gastos para efeito do disposto no artigo 73,
VII, da LE.
De uma consulta singela no Portal da Transparência do Município de Marataízes3
,
se observa que as liquidações com “comunicação social” (subfunção 131), como visto, vieram
crescendo ano a ano e foram os seguintes nos dois quadrimestres dos três anos que
antecederam o ano eleitoral:
1) R$ 114.156,06 (01/01/2017 a 01/09/2017);
2) R$ 153.142,20 (01/01/2018 a 01/09/2018); e
3) R$ 303.241,83 (01/01/2019 a 01/09/2019).
Já quando consultamos o Portal de Transparência segundo a subfunção 695
(Turismo), constatamos que as Liquidações de 2017 indicam que o ente público efetuou gastos
voltados especificamente à área turística com a empresa Televisão Cachoeiro Ltda. na ordem de
R$ 100.000,00 (cem mil reais), pelos seguintes contratos:
– 0001343/2017 – 16/03/2017: R$ 24.766,50;
– 0001342/2017 – 16/03/2017: R$ 34.903,00;
– 0001143/2017 – 08/03/2017: R$ 40.330,50.
Em 2018, outros gastos que alcançaram R$ 147.130,00 (cento e quarenta e sete
mil, cento e trinta reais):
– 0004210/2018 – 30/05/2018: R$ 23.062,00;
– 0002470/2018 – 11/04/2018: R$ 17.364,00;
– 0001247/2018 – 27/02/2018: R$ 15.000,00;
– 0000892/2018 – 26/02/2018: R$ 91.704,00.
E, em 2019, mais despesas na ordem de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil
reais):
– 0003595/2019 – 03/05/2019: R$ 25.125,00;
– 0002708/2019 – 16/04/2019: R$ 110.371,00;
– 0000065/2019 – 22/01/2019: R$ 14.504,00.
Assim, somadas as liquidações com publicidade institucional pelas duas subfunções
(131 e 695) nos dois quadrimestres dos anos anteriores ao ano eleitoral – e sem adentrarmos no
mérito daquilo que a parte requerida sustenta serem despesas de exercícios anteriores (DEA) -,
constata-se gastos na monta de R$ 967.670,09 (novecentos e sessenta e sete mil, seiscentos e
setenta reais e nove centavos), que equivalem a uma média de R$ 322.556,69 (trezentos e vinte
e dois mil, quinhentos e cinquenta e seis reais e sessenta e nove centavos).
Por sua vez, no ano de 2020 (ano eleitoral), o Portal da Transparência aponta que
entre 01 de janeiro de 2020 a 01 de setembro de 2020 os gastos com “Comunicação Social” do
Município de Marataízes, subfunção 131, somaram R$ 936.438,28 (novecentos e trinta e seis mil,
quatrocentos e trinta e oito reais e vinte e oito centavos), ao passo que não se encontra nenhum
gasto destinado à TV Cachoeiro e a qualquer rádio, quando se utiliza a busca pela Subfunção
695.
Para justificar esse aumento tão significativo nas liquidações, o requerido aduz que
a Administração Pública de Marataízes possuía 22 (vinte e dois) processos de liquidação em 2020,
relacionados a publicidades institucionais realizadas no ano de 2019, apresentando um quadro
demonstrativo e sustentando que referidos gastos com publicidade totalizaram R$ 582.816,70
(quinhentos e oitenta e dois mil, oitocentos e setenta e seis reais e setenta centavos), destinados à
empresa Prisma Propaganda Ltda.
Contudo, a tese levantada pela defesa não merece acolhida, pelo que referidos
valores, liquidados até 03 (três) meses antes das eleições de 2020, devem, sim, ser computados para fins
de apuração da ocorrência da prática da conduta vedada prevista pelo art. 73, VII, da Lei n° 9.504/97.
Afinal, como bem enfatizado pelo Ministério Público Eleitoral, que delineou de forma
exaustiva a moldura fática ora apresentada:
“[…].
O município de Marataízes/ES publicou o Edital Concorrência Pública n°
04/2019 em 17/06/2019, para contratação de empresa de publicidade e propaganda.
Posteriormente, em 09/07/2019, o município de Marataízes/ES publicou comunicação
de suspensão, “Sine Die”, Concorrência Pública n° 04/2019. Em 16/07/2019, o
município de Marataízes/ES publicou novo Edital para a licitação em comento.
Ao final, em 25/11/2019, o município de Marataízes/ES publicou o Termo de
Homologação e Adjudicação da Concorrência Pública n° 04/2019, em favor da
empresa Prisma Propaganda Ltda, no valor de R$ 1.500.000,00 (Um milhão e
quinhentos mil reais).
Assim, o município de Marataízes/ES firmou o contrato n° 249/2019 com a
empresa Prisma Propaganda Ltda em 26/11/2019, isto é, trinta e cinco dias antes do
término do ano de 2019.
Logo em seguida, dois dias depois da assinatura do sobredito contrato, o
município de Marataízes/ES efetuou o empenho n° 0007927/2019, em favor da
empresa Prisma Propaganda Ltda, no valor de R$ 800,000,00 (oitocentos mil reais).
Ao final, conforme apontado pelo requerido, o município efetuou, em 2020,
pagamentos no valor de R$ 582.816,70 (quinhentos e oitenta e dois mil oitocentos
e dezesseis reais e setenta centavos), por serviços de propaganda que teriam sido
prestados em apenas 35 (trinta e cinco) dias do ano de 2019. Isto é, a empresa
recebeu, em média, R$ 16.651,91 (dezesseis mil, seiscentos e cinquenta e um reais e
noventa e um centavos), por dia de contrato com o município.
Insta observar que, conforme acima apontado pelo requerido em sua defesa
acima sintetizada, no período compreendido entre os dias 01/01/2019 e 01/09/2019 o
município de Marataízes/ES teria gasto com publicidade o valor de R$ 461.695,25
(quatrocentos e sessenta e um mil, seiscentos e noventa e cinco reais e vinte e cinco
centavos), o que perfaz uma média mensal de R$ 57.711,91 (cinquenta e sete mil,
setecentos e onze reais e noventa e um centavos). Por sua vez, apenas nos 35
(trinta e cinco) dias finais do ano de 2019, o gasto com publicidade teria sido de
R$ 582.816,70 (quinhentos e oitenta e dois mil, oitocentos e dezesseis reais e
setenta centavos).
Por mais que utilizemos um raciocínio voltado para considerar que no último
mês do ano ocorrem as festividades de natal e de ano novo, além dos eventos de
verão, que poderiam, em tese, representar um incremento nos gastos do município
com publicidade, resta totalmente inconcebível, desproporcional e desarrazoado a realização de gastos de publicidade, em 35 (trinta e cinco) dias, em tamanho volume.
Outro ponto que deve ser sopesado diz respeito ao fato de que os objetos das
publicidades que teriam sido realizadas nos 35 (trinta e cinco) dias finais do ano de
2019 pela empresa Prisma Propaganda Ltda, que são perfazem o total de R$
582.816,70 (quinhentos e oitenta e dois mil, oitocentos e dezesseis reais e setenta
centavos), diversamente do que afirmado pelo requerido, tiveram grande repercussão
no ano de 2020 e tenderam a afetar a igualdade de oportunidades entre os futuros
candidatos das eleições daquele ano.
O requerido, às fls. 17 e 18, de sua manifestação de defesa, apresenta uma
relação de objetos de publicidade. Deve ser observado que 69% dos gastos de
publicidade do período em comento, isto é, R$ 403.390,88 (quatrocentos e três
mil, trezentos e noventa e oito reais e oitenta e oito centavos), não dizem respeito
às comemorações do final do ano do município ou à temas de turismo local.
Na realidade, sobredito gasto, trata-se de propagandas sobre outros
temais, tais como, “Anuncio campanha infraestrutura”, “Anuncio de merenda
escolar”, “Banner topo campanha infraestrutura”, “Banner pre index campanha
UPA”, “Banner topo UPA”, “Campanha infraestrutura”, “Campanha
institucional”, “Campanha merenda escolar”, “Campanha UPA”, “Cobertura
“Divulgação em site campanha infraestrutura”, “Divulgação site merenda
escolar”, “Modernização da identidade visual da frota municipal”, “Publicação do
site merenda escolar”, “publicação em site de campanha infraestrutura”,
Publicação site UPA”, “Spot de merenda escolar”, “Spot campanha
infraestrutura”, “Spot mais infraestrutura”, “Super banner campanha
infraestrutura”, “Video e Spot campanha UPA”, “VT campanha infraestrutura”,
“VT merenda escolar”, “VT UPA”, “Web Banner Merenda escolar”, “Web Banneer
UPA” e “Web banner campanha infraestrutura.
Os gastos de publicidade do período em comento, que estão relacionados ou
dizem respeito às comemorações do final do ano do município ou à temas de turismo
local representam apenas 23 %, isto é, R$ 133.452, 82 (cento e trinta e três mil,
quatrocentos e cinquenta e dois reais e oitenta e dois centavos) do gasto total de
publicidade do período, tais como, “Campanha reveillon 2019”, “Cobertura de evento
“Copa litoral unificado de motocross e supercross”, “Divulgação em site reveillon 2019,
“Globoexpressex Campanha Secretaria de Esportes”, “Publicação no site réveillon”,
“Reveillon 2019”, “Spot copa litoral motocross e supercross”, “Spot Insanity Beach”,
“Spot reveillon 2019”, Spot Marataízes Mais”, “VT Copa Litoral Motocros e Supercross”,
“VT insanity beach”, “VT Marataizes Mais”, “Vt Reveillon” e “Web Banneer Reveillon”.
Observe-se, por fim, que 8%, dos gastos de publicidade do período em comento,
foram realizados por meio de processos administrativos que continham tanto elementos
de publicidade relacionados, quanto não relacionados, às comemorações do final do
ano do município ou à temas de turismo local…
[…].
Assim, patente que as condutas praticadas pelo requerido tinham o objetivo de
mascarar, fraudar, burlar, o espírito da vedação legal prevista pelo art. 73, inc. VII, da
Le n° 9.504/97, porquanto, no apagar das luzes do ano de 2019, promoveu a efetiva
realização de publicidade em valor elevadíssimo, com cunho promocional, às vésperas
do início do ano eleitoral, quanto estaria legalmente impedido de realizar os sobreditos
gastos acima da média, nos termos legais.
Sempre deve ser lembrado que, em período de 35 (trinta e cinco) dias, o
município de Marataízes/ES efetivou publicidade no valor total de R$ 582.816,70
(quinhentos e oitenta e dois mil, oitocentos e setenta e seis reais e setenta
centavos).
Emerson Garcia, ao tratar do tema abuso de poder político, acentua que “O
administrador público que não direciona seu obrar para o interesse público, mas
sim, em benefício próprio ou alheio, visando o pleito que se aproxima, incorre em
flagrante violação a toda ordem de princípios estabelecidos na Constituição
brasileira de 1988, os quais erigem-se como consectários lógicos e razão de ser
do próprio Estado Social e Democrático de Direito.” (Emerson Garcia. Abuso de
poder nas eleições. 2. ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, p. 30.) (grifos nossos) A conduta praticada pelo requerido constitui-se em flagrante abuso do poder
político e deve ser sancionada com a proporcionalidade que as condutas representam.
A Justiça Eleitoral não deve se ater às normas contábeis apenas, mas aferir,
pelo conjunto fático-jurídico que lhe é apresentado, o que efetivamente ocorreu,
procurando promover a concretização dos dispositivos e dos princípios constitucionais
que disciplinam a legitimidade e a lisura dos pleitos eleitorais.
Respondendo ao questionamento central da presente demanda, entendo,
levando em conta todo arcabouço acima citado, caracterizado, em especial, pelo abuso
de poder político por parte do requerido, que procurou fraudar a intenção principal da
manutenção da isonomia de oportunidades nas eleições, que não devem ser deduzidas
das despesas liquidadas de publicidade do município de Marataízes/ES, do período de
01/01/2020 à 15/08/2020, o valor de R$ 582.816,70 (quinhentos e oitenta e dois mil,
oitocentos e setenta e seis reais e setenta centavos), referente aos serviços de
publicidade que teriam sido prestados pela empresa Prisma Propaganda Ltda entre
28/11/2019 a 31/12/2019, para fins de apuração da ocorrência da prática da conduta
vedada prevista pelo art. 73, VII, da Lei n° 9.50419 por parte do requerido.
Portanto, incorreu o requerido na conduta vedada acima citada, ao ter, no
período de 01/01/2020 à 15/08/2020, os gastos liquidados com publicidade institucional
realizada pelos órgãos públicos ou por suas respectivas entidades da administração
indireta, no valor de R$ 936.438,28 (novecentos e trinta e seis mil, quatrocentos e
trinta e oito reais e vinte e oito centavo), superiores, portanto, à média dos gastos
dos 2 (dois) primeiros quadrimestres dos 3 (três) últimos anos que antecedem ao pleito,
no valor de R$ 376.656,69 (trezentos e setenta e seis mil, seiscentos e cinquenta e
seis reais e sessenta e nove centavos).
Por todo exposto, considerando todo acervo probatório presente nos autos, o
Ministério Público Eleitoral manifesta-se pelo julgamento antecipado da lide, com a
PROCEDÊNCIA dos pedidos autorais e consequentes, adequadas e proporcionais,
aplicações das sanções de multa e cassação do futuro registro, diploma ou mandato do
requerido Robertino Batista da Silva.
[…].”
Como se extrai, se considerarmos os valores efetivamente liquidados pela
Administração Pública Municipal, sem adentrarmos no conjunto fático-jurídico em que se deram
as despesas, o gestor já teria descumprido a norma em análise, mas as partes divergem acerca
do cômputo ou não da liquidação de R$ 582.816,70 (quinhentos e oitenta e dois mil,
oitocentos e dezesseis reais e setenta centavos), no período de 01/01/2020 a 15/08/2020,
argumentando o representado que a despesa liquidada se refere a serviço de propaganda
institucional contratado junto a empresa Prisma Propaganda Ltda no ano de 2019, pelo que dita
liquidação configuraria Despesa de Exercício Anterior (DEA), não podendo ser contabilizada para
fins do art. 73, VII, da Lei nº 9.504/97, com as alterações inseridas pelo art. 1º, § 3º, VII, da EC nº
107/2020.
A esse respeito, ressalto que o Ministério Público Eleitoral foi extremamente
coerente em sua análise, visto que, por mais que o representado ROBERTINO busque justificar
que a liquidação controvertida tenha por objeto serviços contratados em 26/11/2019, resta
evidenciado que tal conduta não somente teve por objetivo burlar a regra eleitoral, como
influenciou o pleito de 2020, pois os serviços em questão, além de se prestarem, em sua grande
maioria, a enaltecer os feitos da gestão do representado, foram contratados nos últimos 35 (trinta
e cinco) dias do ano de 2019, donde se verifica que, da contratação global de R$ 1.500.000,00
(hum milhão e quinhentos mil reais), houve o imediato empenho da vultosa quantia de R$
800.000,00 (oitocentos mil reais).
Repito aqui que, como bem observado pelo parquet, parte significativa do serviço
liquidado neste intervalo (cerca de 70%), isto é, R$ 403.390,88 (quatrocentos e três mil, trezentos
e noventa e oito reais e oitenta e oito centavos), não diz respeito às comemorações do final do
ano do município ou a atrativos para o turismo local (como quis fazer crer o defendente), se destinando, pois, a divulgar atos da gestão do representado que, no período atinente à prestação
do serviço, apresenta(m) forte conotação eleitoral.
E a conduta é ainda mais grave quando se constata que esses R$ 582.816,70
(quinhentos e oitenta e dois mil, oitocentos e dezesseis reais e setenta centavos) não
estavam na previsão orçamentária de despesas para o ano de 2019, restando cristalinamente
comprovado que o requerido ROBERTINO, premeditadamente, se utilizou de artifício contábil
com intuito de burlar o campo de incidência da norma, na medida em que antecipou o empenho
de despesas com “Comunicação Social” que estavam previstas para o orçamento de 2020 com o
fim de que, oportunamente, como de fato ocorre na espécie dos autos, tivesse argumento legal
ou jurídico para fundamentar que tais se tratavam de despesas de exercício anterior (DEA),
despesas estas que, como de sabença, não seriam computadas para o cálculo da média
constante do artigo 73, VII, da LE, considerando que não relativas aos dois primeiros
quadrimestres do ano de 2019.
Não é demais repisar ser bastante cômodo para a defesa do representado sustentar
a tese de que o juízo deverá considerar a proporcionalidade na compreensão de que referido
gasto – realizado dentro do espaço de apenas 35 (trinta e cinco) dias anteriores ao início do
exercício de 2020 -, deverá ser computado como despesa de exercício anterior (DEA),
argumentando que não poderia, o ente público, ficar sujeito à dinâmica da agência de publicidade
contratada, que não teve tempo hábil para emitir as Notas Fiscais em razão do encerramento do
exercício financeiro do ano de 2019, sem o devido processamento das despesas.
Afinal, sabedor de que não poderia liquidar os vultosos gastos no exercício de 2020,
o requerido ROBERTINO empreendeu estratégia fraudulenta para burlar a lei eleitoral desde o
procedimento licitatório, deflagrado em meados de 2019, mas finalizado no mês de
novembro/2019, sendo que o Termo de Homologação e Adjudicação da Concorrência Pública nº
04/2019 foi publicado em 25/11/2019, ao passo que apenas dois dias após a assinatura do
contrato o município de Marataízes/ES efetuou o empenho n° 0007927/2019, em favor da
empresa Prisma Propaganda Ltda, no valor de R$ 800,000,00 (oitocentos mil reais).
O TSE, recentemente, enfrentou hipótese similar, com voto da Relatoria do Ministro
Jorge Mussi, quando reconheceu a burla ao comando legal pelo fato do candidato ter se utilizado
de instrumentos para apressar o processo de liquidação de modo a evitar que o montante fosse
computado para aferir a média de gastos comparativamente aos anos anteriores.
Vejamos, pois, o aresto que abaixo destaco:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016.
PREFEITO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CONDUTA
VEDADA. ART. 73, VII, DA LEI 9.504/97. ABUSO DE PODER POLÍTICO.
PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. GASTOS VULTOSOS EM COMPARAÇÃO COM
EXERCÍCIOS ANTERIORES. FRAUDE À LEI. ARESTO DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADO QUANTO À GRAVIDADE DOS FATOS. REEXAME DO
CONJUNTO PROBATÓRIO. SÚMULA 24/TSE. DESPROVIMENTO. 1. Agravo
regimental interposto contra decisum monocrático em que se mantiveram
sentença e aresto unânime do TRE/CE de inelegibilidade e multa aos agravantes
(candidato não reeleito ao cargo de prefeito de Itarema/CE e chefe de gabinete)
por abuso de poder político e conduta vedada do art. 73, VII, da Lei 9.504/97 –
materializados em vultosa propaganda institucional em 2016, com notória
promoção pessoal por meio de rádio, televisão, panfletos, revistas, carros de
som e outdoors, cujas peças publicitárias foram contratadas e pagas na segunda
quinzena de dezembro de 2015. 2. O art. 73, VII, da Lei 9.504/97 veda, no primeiro
semestre do ano do pleito, despesas com publicidade institucional que excedam
a média de gastos do primeiro semestre dos três exercícios imediatamente
anteriores. 3. O vocábulo “despesas” deve ser entendido como liquidação, isto é,
o atesto oficial de que o serviço foi prestado, independentemente da data do
respectivo empenho ou pagamento (arts. 62 e 63, § 2º, III, da Lei 4.320/64).
Precedente. 4. No caso, ainda que a liquidação tenha ocorrido em 2015,
evidencia-se verdadeira fraude à lei pelos recorrentes com o intuito de burlar o comando legal e, por conseguinte, afastar as consequências jurídicas advindas
da afronta a esse dispositivo. 5. Todas as etapas para contratar e fornecer a
propaganda aconteceram com celeridade incomum, realizando-se o pregão em
14/12/2015, assinando-se os inúmeros contratos em 15/12 e entregando-se o farto
material – caso, por exemplo, de oitenta mil “panfletos informativos” – em 23/12,
tudo de forma a evitar que a liquidação ocorresse em 2016, quando então o
montante deveria ser computado para aferir a média de gastos comparativamente
com os primeiros semestres de 2013, 2014 e 2015. 6. Reconhecida a fraude, frisese que no primeiro semestre de 2013 não se realizaram despesas com
publicidade, em 2014 o valor foi de R$ 7.980,00 e em 2015 o montante totalizou R$
473,00, com média de R$ 2.817,66. Porém, em 2016 os gastos corresponderam a
estratosféricos R$ 462.906,00, com expressivo acréscimo percentual de
16.428,73%, em inequívoca afronta ao art. 73, VII, da Lei 9.504/97. 7. Concluir de
modo diverso demandaria reexame de fatos e provas, providência inviável em
sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE. 8. Quanto ao abuso de poder,
questiona-se apenas a suposta falta de fundamentação acerca da gravidade (art.
22, XVI, da LC 64/90), que, porém, foi assentada de forma robusta a partir das
seguintes circunstâncias: a) claro objetivo de burlar a legislação; b) vultuoso
acréscimo (em termos absolutos e percentuais) das despesas; c) alcance da
propaganda (12.000 revistas, 16.000 jornais informativos, 80.000 panfletos, quatro
outdoors, 928 horas de serviços de carros de som, espaço diário de 60 minutos
em emissora de televisão de grande audiência e inserções em rádio) no contexto
de município de quarenta mil habitantes; d) inequívoca promoção pessoal; e)
entrega da publicidade no ano do pleito. 9. Agravo regimental desprovido.
(Recurso Especial Eleitoral nº 37820, Acórdão, Relator(a) Min. Jorge Mussi,
Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 240, Data 13/12/2019, Página
37-38)
O E. Min. Relator ressaltou que a fraude à lei materializa-se pela prática de ato
jurídico que, a despeito de legítimo sob o aspecto estritamente formal, “em verdade visa impedir a
obtenção do resultado prático a que se propõe a norma”, citando, inclusive, o voto de vista
proferido pelo E. Ministro Edson Fachin nos autos do REspe nº 193-92.2016.6.16.001 8/PI,
também da relatoria do Douto Min. Jorge Mussi.
A propósito do voto, seguem alguns trechos:
“[…].
No Brasil, ao contrário do que ocorre com institutos assemelhados, como a
simulação, o abuso de forma e o abuso de direito, e também como ocorre em alguns
países como a Itália e a Espanha, não há uma definição legal expressa para a fraude à
lei, o que não significa que o ordenamento pátrio seja, a ela, indiferente.
O ato de fraude à lei já havia sido referido no Digesto (D. 1, 3, 29), em
contraste com a sua simples violação, no sentido de que “age contra a lei aquele que
faz o que a lei proíbe; age em fraude à lei aquele que, respeitando as palavras da lei,
elude o seu sentido”.
Essa conceituação, de aluma maneira, guarda atualidade, pois a doutrina
configura a fraude à lei quando alguém realiza um ato, invocando o amparo de
determinada norma (lei de cobertura), com a intenção de atingir fins vedados por outra
norma legal (norma defraudada).
Em obra dedicada ao tema, Manuel Atienza e Juan Ruiz Manero estabelecem
a distinção entre ilícitos típicos e atípicos, elegendo como elemento discriminador a
distinção entre regras e princípios.
Assim, fixando o conceito legal de ilícito como um ato ou um comportamento
contrário a uma norma que imponha deveres ou proibições, os autores destacam que
os ilícitos típicos seriam aqueles decorrentes da inobservância de regras que impõem
obrigação ou proíbe determinada conduta, cuja descrição seja relativamente precisa,
permitindo uma subsunção da ação a esse mandamento. Os ilícitos atípicos, por sua
vez, decorreriam de condutas contrárias a princípios, de modo que, a despeito da
observância de uma regra, a ilicitude decorre da inversão de seus fins:
… são ilícitos atípicos que, por assim dizer, invertem o sentido de uma regra; prima fade
existe uma regra que permite a conduta em questão; contudo – e em razão de sua
oposição a algum princípio ou princípios -, essa conduta se converte, uma vez
considerados todos os fatores, em ilícita; isso, em nossa opinião, é o que ocorre com o
abuso de direito, a fraude à lei e o desvio de poder. (ATIENZA, Manuel; MANERO, Juan
Ruiz. Ilícitos atípicos: sobre o abuso de direito, fraude à lei e desvio de poder. São
Paulo: Marcial Pons, 2014, p. 27).
Incluída na espécie de ilícitos atípicos, a fraude à lei e o abuso do direito,
“surgem a partir de um certo momento de desenvolvimento de muitos Direitos, quando
esses Direitos perdem o formalismo característico das primeiras etapas de sua
evolução e começa a ser possível uma interpretação das normas que tenha em conta
as finalidades e os valores que subjazem às mesmas e que, portanto, vá além da
interpretação meramente literal” (ATIENZA, Manuel; MANERO, Juan Ruiz. ob. cit., p.
57).
Como decorrência dessa nova realidade, o Direito tem procurado impedir que
as normas jurídicas sejam utilizadas para lograr finalidades não acolhidas pelos
princípios que o estruturam. Exige-se, na atual quadra, uma integridade sistêmica que
se revela, também, pela coerência entre regras e princípios.
Assim, existirá fraude à lei quando for utilizada uma norma jurídica, com o
propósito de eludir a aplicação de outra. Ou seja, a fraude à lei decorrerá sempre de
um ato jurídico formalmente legítimo, impedindo a obtenção do resultado ou fim prático
que a norma se propõe. Estão envolvidas, portanto, duas normas: a chamada “norma
de cobertura” (consistente numa regra) que é observada e a “norma defraudada”
(consistente num princípio) que é aquela violada e é definidora de fins. Trata-se, enfim,
por via indireta e pela prática de um ou vários atos lícitos, de obter um resultado que o
Direito proíbe.
[…].”
E é esta mesma fraude à lei que vemos no caso em análise, pois, dando ares de
legalidade ao procedimento e adiantando a prestação dos serviços e a liquidação das despesas,
o representado ROBERTINO acabou, assim, por encampar a seu favor um argumento jurídico
para sustentar sua tese de que não estava impedido de realizar as vultosas despesas com
publicidade institucional, mesmo porque, os gastos elevaram os patamares médios dos anos
anteriores e, com efeito, não fugiriam da média dos últimos 03 (três) anos (2017, 2018 e 2019),
para os fins do artigo 73, VII, da LE.
Induvidoso e cristalino que as despesas contratadas ao apagar das luzes do ano de
2019 não poderiam ser liquidadas tão rapidamente dentro daquele exercício fiscal de 2019 e,
apesar de haver documentos – juntados do a resposta – atestando a execução de algumas das
propagandas a partir do dia 07 de dezembro de 2019, as divulgações bateram às portas do ano
eleitoral e adentraram no ano eleitoral de 2020, a exemplo da liquidação 0087/2020 (ID 8139358)
e demais outras, onde consta no “histórico” que as despesas se referiam a publicidades do ano
de 2019, mas a Nota Fiscal de serviços data de 10/01/2020.
Ainda que assim não fosse, o fato é que as despesas liquidadas, mesmo que os
serviços tenham sido prestados às vésperas do ano eleitoral, se referem a contrato que sequer
deveria ter sido levado a efeito no exercício de 2019, cujos gastos correspondentes tinham
previsão para execução no ano de 2020 – como grande parte restou por ser executada neste
exercício (2020) -, além do que, transparece hialino que, nesse período, a propaganda
institucional também foi intencionalmente desvirtuada para fins de promoção pessoal do agente
político, o que também ocorreu durante o ano eleitoral.
A propósito, seguimos a análise.
2.2 – DO USO DA PROPAGANDA INSTITUCIONAL PARA PROMOÇÃO
PESSOAL
Sustenta o representante que o representado se valeu do espaço destinado a propaganda institucional para se autopromover, colacionando na peça de ingresso reportagens
em que o nome e a imagem deste são destacadas, conforme acima relatado.
Em contrapartida, defende o representado que o destaque que lhe foi atribuído
pelas ações do Setor de Comunicação é “inerente ao seu cargo de Chefe do Executivo Municipal,
permitido e tolerado pela Legislação Eleitoral pois praticado em todas as esferas de Poder”.
Pois bem! Acerca do tema, o art. 37, § 1º, da CRFB enuncia categoricamente que “a
publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter
caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes,
símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”,
sendo evidente que a regra constitucional tem por finalidade precípua divulgar temas relevantes à
coletividade, bem como evitar que o administrador se utilize da máquina pública para se
autopromover, salvaguardando assim vetores constitucionais, como os princípios da
impessoalidade e da moralidade.
In casu, não há como negar que o destaque conferido ao representado ultrapassa,
em muito, a esfera do razoável, mormente porque sua imagem e seu nome público (“Tininho”)
foram veiculados inúmeras vezes em detrimento da figura do Município de Marataízes (no sítio
eletrônico do Ente Público), transmitindo a ideia de que obras, convênios e demais atos públicos
foram realizados diretamente e unicamente pelo representado, ecoando daí a autopromoção
vedada pela regra constitucional, conforme se vê dos seguintes trechos (acompanhados da
imagem do representado): “PREFEITO TININHO DESTINA REPASSE DE R$ 3 MILHÕES PARA
FUNCIONAMENTO DA UTI DO HOSPITAL EVANGÉLICO LITORAL SUL”; “Prefeito visita Mercado do Peixe da
Barra do Itapemirim”; Tininho Batista visita reforma e ampliação do Caic da Barra”; “Obras não param nem no feriado
em Marataízes”; “Com pandemia e tudo, o prefeito Tininho Batista está transformando Marataízes para muito
melhor”; “Nota de Repudio – FAKE NEWS também CONTAMINA – […] Dessa forma, desde 23/03/2020, todo o corpo
responsável da PMM, a começar pelo Prefeito Tininho Batista e o Secretário de Saúde Eraldo Duarte, estão
debruçados incansavelmente para proteger a população marataizense da pandemia”; “EM MOMENTO ALGUM
PREFEITO TININHO BATISTA CULPOU PRODUTORES DE ABACAXI PELA CHEGADA DA PANDEMIA A
MARATAÍZES”.
Vê-se que o representado transformou a “Comunicação” do Município de Marataízes
em um verdadeiro veículo de divulgação pessoal, utilizando-o de forma reprovável até mesmo
para se justificar perante o eleitorado maratimba por manifestações ou decisões adotadas no
período da Pandemia da Covid-19 (quando ainda era pré-candidato), acarretando vantagem e
evidente desequilíbrio frente aos demais pré-candidatos.
Acresça-se a isso que, nos autos da representação eleitoral nº 0600018-
11.2020.6.08.0043 o representado e diversos apoiadores seus, inclusive, os representantes da
Rádio Marataízes Ltda., foram condenados por este juízo eleitoral ao pagamento de multa por
propaganda irregular antecipada (art. 36, § 3º, da Lei nº 9.504/97), situação que implica na
compreensão de que grande parte do ambiente da comunicação local era voltada a potencializar
o desvirtuamento da propaganda institucional em benefício da campanha eleitoral do
representado ROBERTINO.
Em verdade, não há que se falar em “pequeno destaque”, como quis fazer crer o
representado em sua defesa, posto que a propaganda veiculada nada possui de educativa,
informativa ou de orientação social, travestindo-se, em verdade, de ato abusivo de promoção do
administrador público, que, valendo-se de seu cargo, e em manifesto desvio de finalidade,
enaltece, com a divulgação excessiva da sua imagem, feitos do Município de Marataízes como se
seus fossem, beneficiando sua candidatura a reeleição no pleito de 2020.
A propósito, seguem os arestos abaixo destacados:
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2014. GOVERNADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO
JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER POLÍTICO, DE AUTORIDADE E ECONÔMICO.
CONDUTA VEDADA A AGENTES PÚBLICOS. PROVIMENTO PARCIAL. IMPOSIÇÃO DE MULTA.
DO ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO (ART. 22 DA LC 64/90), DO ABUSO DE
AUTORIDADE (ART. 74 DA LEI Nº 9.504/97) E DAS CONDUTAS VEDADAS A AGENTES
PÚBLICOS (ART. 73, IV, VI, B, E § 10, DA LEI Nº 9.504/97). 1. Abuso de poder político configurase quando agente público, valendo-se de condição funcional e em manifesto desvio de
finalidade, desequilibra disputa em benefício de sua candidatura ou de terceiros, ao passo que
abuso de poder econômico caracteriza-se por emprego desproporcional de recursos
patrimoniais, públicos ou privados, de forma a comprometer a legitimidade do pleito e a
paridade de armas entre candidatos. Precedentes. 2. Constitui abuso de autoridade
infringência ao art. 37, § 1º, da CF/88, segundo o qual publicidade de atos, programas, obras e
serviços de órgãos públicos não conterá nomes, símbolos ou imagens que impliquem
promoção pessoal de autoridades ou servidores (art. 74 da Lei nº 9.504/97). 3.[…]. 5. Com
advento do instituto da reeleição, é corriqueiro que chefes do Poder Executivo a níveis federal,
estadual e municipal, a pretexto de divulgar obras, serviços e outras atividades
governamentais, realizem promoção em benefício próprio ou de terceiros visando futura
candidatura. Essa conduta, além de absolutamente reprovável pelo uso da Administração
Pública como verdadeiro veículo de divulgação pessoal, inserindo o administrador em clara
vantagem perante seus adversários com recursos do erário, afronta os principais valores que
norteiam a publicidade institucional, a qual deve possuir cunho exclusivamente informativo,
educativo ou de orientação social. 6. Contudo, no caso específico, em virtude dos aspectos já
esclarecidos no item 3 deste tópico falta de menção expressa ao pleito e de dados de
audiência, retirada da publicidade ainda no início da campanha, grande diferença de votos e
poucas notícias as sanções de cassação de diploma e de inelegibilidade por abuso de poder
(art. 22, XIV, da LC 64/90) são igualmente desproporcionais à conduta, o que não impede sua
apuração em outras esferas. Conclusão. 1. Recurso ordinário parcialmente provido para
aplicar a cada um dos recorridos multa de R$ 5.350,00 com base no art. 73, VI, b e § 4º, da Lei
nº 9.504/97. (TSE; RO 3783-75.2014.6.19.0000; RJ; Rel. Min. Herman Benjamin; Julg.
03/05/2016; DJETSE 06/06/2016; Pág. 9)
CONCLUSÃO
De acordo com o quadro fático que nos foi apresentado e as circunstâncias de como
a ação foi engendrada pelo requerido ROBERTINO, denota-se evidente comprometimento da
lisura do pleito, considerando:
1) que desde a previsão orçamentária para ano eleitoral (2020) havia indicativo
de gastos com publicidade bem acima da média dos últimos 03 (três) anos (2017, 2018 e 2019);
2) a caracterização de fraude ao artigo 73, VII, da LE, no aspecto da antecipação
dos gastos com publicidade institucional no montante de R$ 582.816,70 (quinhentos e oitenta
e dois mil, oitocentos e setenta e seis reais e setenta centavos);
3) o efetivo acréscimo das despesas com publicidade, cuja média de
liquidações nos dois quadrimestres era de menos de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) e
alcançou o patamar de R$ 936.438,28 (novecentos e trinta e seis mil, quatrocentos e trinta e
oito reais e vinte e oito centavo) no ano eleitoral de 2020;
4) a comprovação do uso da imagem e do nome público do representado
(“TININHO”) veiculados inúmeras vezes em detrimento da figura do Município de Marataízes
(no sítio eletrônico do Ente Público), ecoando na mente dos cerca de 37 mil habitantes tanto
às vésperas do ano eleitoral como durante este, configurando abuso de poder político e de
autoridade, com inequívoca promoção pessoal do gestor.
Não se tratam, pois, de irregularidades de pequena monta, depreendendo-se, enfim,
que os fatos possuem gravidade suficiente para comprometer a higidez do processo eleitoral, não
somente com a aplicação da sanção de multa, como, também, com a cassação do mandato
eleitoral.
Vejamos, pois:
EMENTA: ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO
JUDICIAL ELEITORAL. CONDUTA VEDADA. GASTOS EXCESSIVOS COM PUBLICIDADE
INSTITUCIONAL NO PRIMEIRO SEMESTRE DO ANO DA ELEIÇÃO. ABUSO DE PODER
POLÍTICO/AUTORIDADE. DESVIRTUAMENTO DA PUBLICIDADE INSTITUCIONAL NO
PRIMEIRO SEMESTRE DO ANO DA ELEIÇÃO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. Deve ser afastada a preliminar de ilegitimidade ativa da coligação em razão do indeferimento do
registro de seu candidato, uma vez que as coligações, embora tenham existência efêmera,
possuem personalidade própria, cuja regularidade independe da do candidato. 2. Com base na
compreensão da reserva legal proporcional, nem toda conduta vedada e nem todo abuso do
poder político acarretam a automática cassação de registro ou de diploma, competindo à
Justiça Eleitoral exercer um juízo de proporcionalidade entre a conduta praticada e a sanção a
ser imposta. 3. O Tribunal Regional Eleitoral concluiu pela cassação do diploma, declaração
de inelegibilidade e aplicação de multa com fundamento em conduta vedada (extrapolação
dos gastos com publicidade institucional) e abuso do poder político (desvirtuamento da
publicidade institucional). 4. Conduta vedada e gastos com publicidade institucional: os
gastos com publicidade institucional não podem ultrapassar a média dos três anos anteriores
ou a do ano imediatamente anterior à eleição – art. 73, inciso VII, da Lei nº 9.504/1997. A
compreensão sistemática das condutas vedadas, que busca justamente tutelar a igualdade de
chances na perspectiva da disputa entre candidatos, leva à conclusão de que, no primeiro
semestre do ano da eleição, é autorizada a veiculação de publicidade institucional,
respeitados os limites de gastos dos últimos três anos ou do último ano, enquanto, nos três
meses antes da eleição, é proibida a publicidade institucional, salvo exceções (art. 73, inciso
VI, alínea b, da Lei nº 9.504/1997). Consequentemente, os gastos com publicidade
institucional, no ano de eleição, serão concentrados no primeiro semestre, pois no segundo
semestre, além das limitações, algumas publicidades dependem de autorização da Justiça
Eleitoral. O critério a ser utilizado não pode ser apenas as médias anuais, semestrais ou
mensais, nem mesmo a legislação assim fixou, mas o critério de proporcionalidade. O acórdão
regional demonstra que os gastos no primeiro semestre de 2012 (R$1.340.891,95 – um milhão,
trezentos e quarenta mil, oitocentos e noventa e um reais e noventa e cinco centavos)
representaram aproximadamente: 68% dos gastos realizados em 2011 (R$1.958.977,91 – um
milhão, novecentos e cinquenta e oito mil, novecentos e setenta e sete reais e noventa e um
centavos), 24% a mais do que os realizados em 2010 (R$1.079.546,97 – um milhão, setenta e
nove mil, quinhentos e quarenta e seis reais e noventa e sete centavos) e 94% dos gastos do
ano de 2009 (R$1.415.633,93 – um milhão, quatrocentos e quinze mil, seiscentos e trinta e três
reais e noventa e três centavos), o que dispensa maiores cálculos matemáticos acerca da
evidente desproporcionalidade das despesas com publicidade institucional no primeiro
semestre de 2012, a revelar quebra da igualdade de chances. Some-se a isso o fundamento
ressaltado pelo acórdão regional de que “os números demonstram que os gastos em excesso
foram bastante expressivos, superiores a 80% (oitenta por cento) do valor autorizado por lei, o
que torna a conduta ainda mais grave” (fl. 356). 5. Abuso de poder político no desvirtuamento
da publicidade institucional: o princípio da publicidade, que exige o direito e o acesso à
informação correta dos atos estatais, entrelaça-se com o princípio da impessoalidade,
corolário do princípio republicano. A propaganda institucional constitui legítima manifestação
do princípio da publicidade dos atos da administração pública federal, desde que observadas
a necessária vinculação a temas de interesse público – como decorrência lógica do princípio
da impessoalidade – e as balizas definidas no art. 37, § 1º, da Constituição Federal de 1988,
segundo o qual, “a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos
públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo
constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou
servidores públicos”. Enquanto a propaganda partidária é um canal de aproximação entre
partidos e eleitores, disponível a todas as agremiações registradas no Tribunal Superior
Eleitoral, a publicidade institucional de municípios é uma ferramenta acessível ao Poder
Executivo local e sua utilização com contornos eleitorais deve ser analisada com rigor pela
Justiça Eleitoral, sob pena de violação da ideia de igualdade de chances entre os contendores
– candidatos -, entendida assim como a necessária concorrência livre e equilibrada entre os
partícipes da vida política, sem a qual fica comprometida a própria essência do processo
democrático. Acórdão regional que demonstra concretamente grave desvirtuamento da
publicidade institucional. É inviável o reenquadramento jurídico dos fatos. 6. Desprovimento
do recurso. (TSE – RESPE: 00003364520126240086 BRUSQUE – SC, Relator: Min. Gilmar
Ferreira Mendes, Data de Julgamento: 24/03/2015, Data de Publicação: RJTSE – Revista de
jurisprudência do TSE, Volume 26, Tomo 1, Data 24/03/2015, Página 418 DJE – Diário de justiça
eletrônico, Tomo 72, Data 16/04/2015, Página 92/93 REPDJE – Republicado DJE, Tomo 73, Data
17/04/2015, Página 45/46)
Em tom final, esclareço que a chapa majoritária é una e indivisível, razão pela qual,
pela natureza da sua relação jurídica, a cassação do diploma do Chefe do Executivo
irremediavelmente atingirá o Vice.
Contudo, apesar de ter sido beneficiado em decorrência do abuso de poder político
ou de autoridade, não há nenhum indicativo de contribuição direta de JOSÉ AMINTAS PINHEIRO MACHADO (Vice-Prefeito que integra a chapa majoritária vencedora) nas irregularidades e
ilegalidades encontradas, mesmo porque, só passou a ser candidato para as eleições de 2020 e
os atos impugnados dizem respeito propriamente a gestão dos gastos com publicidade pelo
candidato à reeleição para o cargo de Prefeito, razão pela qual não deverá sofrer as sanções de
inelegibilidade e pecuniária (artigo 22, XIV, da LC nº 64/90).
3 DISPOSITIVO
Do exposto, ACOLHO, em parte, o pedido inicial, no sentido de:
1) cassar os diplomas conferidos ao Prefeito ROBERTINO BATISTA
DA SILVA, vulgo “TININHO BATISTA” e ao Vice-Prefeito JOSÉ AMINTAS
PINHEIRO MACHADO, integrantes da chapa vencedora do pleito eleitoral
majoritário de 2020;
2) condenar o representado ROBERTINO BATISTA DA SILVA, vulgo
“TININHO BATISTA”, consideradas as circunstâncias acima delineadas, ao
pagamento de multa que fixo em 20.000 UFIR;
3) reconhecer a incidência da sanção de inelegibilidade prevista no
artigo 1º, I, “j”, da LC nº 64/90 (por 08 anos a contar da data das eleições),
exclusivamente em relação ao representado ROBERTINO BATISTA DA SILVA,
vulgo “TININHO BATISTA”.
A vista da conclusão ora adotada, determino sejam extraídas cópias dos autos, com
seu imediato encaminhamento ao Ministério Público Estatual para apuração de eventuais atos de
improbidade administrativa (§ 7º do artigo 73 da LE).
P. R. I.
Com o trânsito em julgado, cumpra-se a sentença até seus ulteriores termos e ao
fim, arquive-se.
Diligencie-se.
Marataízes/ES, 27 de janeiro de 2021.
JORGE ORREVAN VACCARI FILHO
Juiz Eleitoral
Fonte: Saiba Notícias