Os Estados Unidos são apontados como o principal destino das missões e postos militares brasileiros no exterior, de acordo com um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A análise abrange o período de 2020 a 2023 e destaca que a frequência de capacitações e cooperações militares com os EUA aponta para um desalinhamento com os objetivos gerais da Política Nacional de Defesa (PND) e da Estratégia Nacional de Defesa (END), concentrando as influências em um único país.
Essa preferência pelos Estados Unidos remonta ao alinhamento histórico do Brasil com o país durante a Guerra Fria. A presença norte-americana tem sido marcante desde a assinatura do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) em 1947, passando pela criação da Organização dos Estados Americanos (OEA) em 1948, o Acordo Militar Brasil-Estados Unidos em 1952, até os mecanismos institucionais regionais na área de defesa, como a Conferência de Ministros da Defesa das Américas e o William J. Perry Center for Hemispheric Studies.
Apesar disso, o cenário internacional atual é multipolar, com o aumento da competição entre grandes potências, como China, Índia e Rússia. Concentrar as cooperações militares em um único país, como os EUA, pode não ser tão produtivo diante da diversidade de parcerias disponíveis e da tradição da política externa brasileira nesse sentido.
Os registros do estudo foram baseados em informações do Diário Oficial da União, na Biblioteca da Presidência da República e na base de dados “Concórdia” do Ministério das Relações Exteriores. Dados indicam que os EUA são o destino mais frequente para cursos de pós-graduação de militares brasileiros, com 27 estudantes nos três anos analisados, o triplo do Reino Unido, que ocupa o segundo lugar. Além disso, 134 militares brasileiros participaram de cursos nos EUA, sendo 97 oficiais superiores.
Segundo a análise, essa concentração de cooperações nos EUA desfavorece os interesses da política externa brasileira, especialmente no que diz respeito a países importantes no cenário internacional e em espaços de decisão multilaterais, como o Conselho de Segurança da ONU. O estudo traz 14 recomendações políticas para a atuação internacional do setor de defesa brasileiro, destacando a importância de priorizar o “entorno estratégico brasileiro” e buscar colaborações em outras áreas estratégicas, como a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e países do Atlântico Sul.
A iniciativa do estudo busca contribuir para o debate público e precede a apresentação da nova Política de Defesa Nacional, da Estratégia Nacional de Defesa e do Livro Branco de Defesa Nacional ao Congresso Nacional até o fim do semestre. O documento visa fornecer informações sobre a visão, interesses e política de defesa do Brasil ao mundo, além de propor recomendações para a atuação internacional do setor de defesa.