Confira abaixo a íntegra do artigo “Governança eleitoral: após eleito, o então candidato se desobriga das propostas apresentadas? ”, de autoria do conselheiro-corregedor do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES), Rodrigo Coelho do Carmo. O texto, que faz uma reflexão sobre as obrigações eleitorais do candidato, após eleito democraticamente, foi publicado na edição desta quinta-feira (05) do jornal A Tribuna.
Governança eleitoral: após eleito, o então candidato se desobriga das propostas apresentadas?
Estamos no período de eleições municipais e cabe a reflexão sobre a delegação eleitoral na ótica da governança pública e da visão estadista que deve nortear a atuação dos agentes públicos.
Durante o pleito os candidatos a Prefeito expõem suas convicções e apresentam suas propostas para o desenvolvimento das cidades e das políticas públicas. Essas, conhecidas como Programa de Governo, são registradas na justiça eleitoral e tornam-se o documento oficial contendo os compromissos assumidos com o detentor originário do poder: o povo.
Estabelece-se nesse momento uma intrínseca relação entre o Plano Plurianual, Programa de Governo e as Cortes de Contas.
Explico. Findo o processo eleitoral o mandatário eleito, com base no seu Programa de Governo, atuará na gestão pública seguindo instrumentos de planejamento e orçamento, dentre eles o Plano Plurianual (PPA), que é uma das leis que regem as ações dos gestores.
É no PPA, compatibilizado com o Programa de Governo, que são instituídas as diretrizes, objetivos e metas a serem implementados no mandato, bem como os indicadores por meio dos quais o governante entende que as políticas públicas devem ser avaliadas. Este governante tem suas Prestações de Contas apreciadas pelas Tribunais de Contas.
Os candidatos têm autonomia para criar suas propostas, mas na medida que as fazem, entendo que surge o direito subjetivo do cidadão que as aceitou em vê-las implementadas, sob pena de acolhermos o chamado de “estelionato eleitoral”.
Não me parece razoável o fato de, após eleito, o então candidato desobrigar-se das propostas apresentadas, aceitas pela população pelo voto, como se as mesmas tivessem validade apenas para o pleito e, na condição de governante, não lhe ser imputada a obrigatoriedade de cumpri-las, desconsiderando o liame subjetivo estabelecido.
Sabemos que os papeis sociais das instituições públicas se complementam e cada vez mais a sociedade demanda por uma atuação tempestiva e eficiente do Poder Público.
Sob o prisma da governança pública, a partir do processo de delegação eleitoral, o controle externo ganha relevo. Isso porque o papel desempenhado pelas Casas de Contas é primordial para a responsabilidade na gestão fiscal, cujo pressuposto é a ação planejada e transparente em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas.
Cabe aos Tribunais, no exercício da Accountability, além da análise de conformidade e legalidade dos atos de gestão, avaliar os resultados, a efetividade e a eficiência das políticas públicas constantes no PPA.
Assim, no espectro da governança eleitoral e respeitando os Princípios da Soberania Popular e da Indisponibilidade do Interesse Público, o PPA deve demonstrar o planejamento para execução do Programa de Governo.
Vislumbro nas Cortes de Contas uma instituição fundamental para a Democracia e que, à luz do checks and balances, atua de maneira preponderante no combate à corrupção e à ineficiência na gestão dos recursos públicos, bem como no aprimoramento das boas práticas administrativas.
Rodrigo Coelho
Conselheiro corregedor